terça-feira, 29 de maio de 2012


Caro João,



Sabe quando você se pergunta por que as meias sempre furam no dedão? É. Não é no calcanhar, nem na sola do pé, é no dedão. Será que os seus dedos crescem ou as traças sentem um prazer mórbido em mordiscar a cobertura do dedão? E por que as fábricas, tão evoluídas tecnologicamente, ainda não descobriram um jeito de fazer meias que não furem nos dedões?

Parece bobagem, não parece? Não só parece como é. Mas eu comecei essa carta assim porque queria te falar sobre os detalhes.

Esses instantes que passam, acontecem, e se não fosse por eles, a nossa vida poderia ser diferente.

Sabe do que estou falando?

Daquela vez que você voltou pra buscar uma caneta e perdeu o ônibus e teve que esperar meia hora até pegar o próximo. Merda! E tantas canetas poderiam ser compradas no caminho...

E daquela vez que você disse “Vou pensar e te respondo amanhã”, e amanhã já não havia mais chance, nem resposta a ser dada.

Ou daquele beijo que você não deu, daquela palavra que não foi dita: obrigado, te amo, estou feliz assim, quero mais, prefiro de outro jeito...

E tudo mudou desde então.

Como é que você descobre que está sendo traído, João?

Porque há um silêncio frio durante o jantar? Por que as suas piadas já não são mais engraçadas? Ou por que você não presta mais atenção naquela história que ouviu mil vezes?

Pode ser qualquer coisa: uma xepa de cigarro de uma marca diferente deixada na sacada, uma toalha dobrada de forma diferente, um perfume novo, uma resposta errada...

E tudo que era perfeito deixa de ser.

Sabe por quê? Porque não existe receita e você não prestou atenção nos detalhes. São eles que fazem a diferença.

Você conhece a história do cara da gravata? Ele preferiu comprar a gravata de algodão ao invés da de seda. Pois bem, naquele dia o trem estava saindo e ele enfiou a pasta na porta para poder entrar, mas o motorista fechou a porta mesmo assim. Ele puxou a pasta, mas a gravata continuou trancada na porta. Ele saiu correndo e tentando puxar a gravata, mas não conseguiu porque ela era de algodão e mais forte que a de seda, que teria se rasgado. Ele teve a cabeça arrancada no final da estação.

Não sei porque as meias sempre furam no dedão, mas eu prefiro comprar só gravatas de seda.


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